Xangô havia conquistado o poder da cidade de Oyó e se tornado o seu terceiro soberano, governando com muita severidade e domínio total sobre seu povo, que não tentava irritá-lo ou ofendê-lo, pois ele era o possuidor do edún àrá, a pedra do raio.
Seu símbolo de poder é o osé, um machado de lâmina dupla como representação de que “sua força é uma arma de dois gumes”, que equivale dizer que o mais distante habitante de Oyó não estava longe da autoridade de Xangô ou imune aos seus castigos pelos delitos cometidos.
Embora consciente de seu poder, Xangô sempre queria novos meios de se fazer respeitado e temido por todos. Enviava seus mensageiros até os locais mais longínquos em busca de poções mágicas e amuletos, com o objetivo de aumentar o seu poder. Um a um iam chegando os elementos pedidos sem que satisfizessem os desejos de Xangô. Decidiu ele, então, pedir a Exú.
Enviou um de seus homens de confiança para as terras de Ìbàrìbá, onde Exú se instalara, próximo à região dos Tápà. Lá chegando, o mensageiro declarou: “Oba Jàkúta, o grande Aláààfin de Oyó, enviou-me aqui para que lhe seja preparado um poder eficaz que cause terror no coração de seus inimigos”. Exú perguntou: “Sim, isto é possível. Mas que tipo de poder Xangô deseja?”. O mensageiro respondeu: “Oba Jàkúta disse que muitos tentaram lhe dar o poder que ainda não tem, mas eles não sabem como fazê-lo. Tais conhecimentos pertencem somente a Exú. Dê o que precisa que ele saberá o que fazer.”
Disse Exú: “Sim, do que Xangô precisa eu sei bem e eu lhe darei. Em troca quero receber uma cabra como sacrifício. O poder estará pronto em 7 dias; porém, você não deverá ser o portador. Quem deverá vir aqui buscar será a esposa dele, Oyá”.
O mensageiro retornou para Oyó e transmitiu a Xangô o recado de Exú, que concordou com o que lhe foi dito, e já no sétimo dia, Xangô instruiu Oyá para que fosse buscar a fórmula: “Cumprimente Exú por mim. Diga-lhe que o sacrifício será enviado. Receba o poder que ele preparou e traga-o para cá rapidamente”. Em seguida Oyá partiu.
Chegando às terras de Exú, Oyá cumprimentou-o: “Xangô, de Oyó, enviou-me para apanhar o que foi preparado para ele. O sacrifício que você pediu em troca já está a caminho”. Em seguida, Exú entregou a Oyá um pequeno pacote embrulhado em uma folha silvestre, ewé ogbó, e lhe disse: “Tome cuidado com isto. Diga a Xangô que beba tudo.”
Pegando o pacote, Oyá iniciou a jornada de volta. Mas a curiosidade começou a atiçá-la: “O que Exú fez para Xangô? Que espécie de poder pode estar neste pacote tão pequeno?” Ao longo do trajeto de volta, Oyá foi pensando no assunto, quando resolveu parar para descansar. Como Exú havia presumido que ela faria, Oyá desembrulhou o pacote para olhar o que havia dentro. E o que viu possuía uma coloração vermelha. Colocou um pouco da fórmula na boca para testá-la. Não era bom nem era ruim. Ficou pensativa por um instante, embrulhou o pacote e seguiu viagem.
Ao chegar a Oyó, foi direto para o palácio de Xangô. Assim que o viu entregou-lhe o pacote. Xangô perguntou: “Que instruções Exú deu a você? Como eu tenho de usar este poder?”
Oyá disse: “Ele instruiu para ingerir o poder.” Nem bem começou a falar, faíscas saíram de sua boca. Xangô entendeu que Oyá havia testado o poder que lhe havia sido destinado. Sua ira foi violenta. Levantou a mão para bater-lhe, mas ela escapou do palácio. Xangô a perseguiu, mas não a encontrou. Oyá foi para um lugar onde muitas ovelhas estavam pastando. Correu entre elas, pensando que Xangô não a encontraria. Mas a ira de Xangô era terrível. Ele lançou seu grito, estrondos em todas as direções, a ponto de atingir as ovelhas, matando-as todas. Oyá escondeu-se, então, embaixo das ovelhas mortas, conseguindo assim iludir Xangô que cansado retornou ao palácio onde uma multidão o aguardava. Todos suplicavam pela vida de Oyá. “Sua compaixão é maior do que a sua ofensa. Perdoai-a”. A ira de Xangô se atenuou. Ele enviou seus escravos para encontrar Oyá e trazê-la de volta.
Xangô não sabia, exatamente, como Exú havia lhe destinado o poder. Assim, quando a noite chegou, Xangô pegou o pacote com o poder e foi para um lugar alto contemplar a cidade. Lá, colocou um pouco do poder sobre a língua, e, quando expirou o ar, uma enorme chama saiu de sua boca, estendendo-se por toda a cidade. Xangô passou a ter o poder sobre o fogo, que brotava de sua boca e de suas narinas, e, com isso, passou a intimidar seus adversários.
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