quinta-feira, 30 de junho de 2011

Águas de Oxalá

Oxalufã (Oxalá velho) vivia com seu filho Ogum, mas sentia falta de Xangô, seu outro filho querido, Rei do povo iorubá. O velho queria tanto visitar seu filho, mas nada podia ser feito sem consultar o babalaô, senhor do destino. Oxalá vai visitar o adivinho, que o aconselha a desistir da viagem, os búzios não tinham visto bons presságios. Oxalá tem saudades do filho e, escondido, deixa o reino de Oxum rumo ao país dos Iorubás. No caminho, encontra uma velha que suava e arquejava sob o peso de um tonel de azeite. Oferece ajuda, mas seu cavalo foge e Oxalá sai correndo atrás dele. O povo da aldeia vendo o velho perseguir o cavalo o toma por um ladrão. Oxalá é capturado, agredido, tem suas pernas quebradas e é condenado pelo conselho da tribo a ficar 7 anos preso.

Enquanto isso, Xangô estava triste em seu palácio. Uma tristeza sem nome, sem razão. Uma pontada no peito tão doída que ele decide consultar o babalaô: o que é isso que me acontece? O adivinho mostra a ele a prisão onde seu pai, Oxalá espera. O filho parte para libertar o pai imediatamente. Saindo do fundo da prisão para a luz, Oxalá tem tanta sede, quer água, muita água. Xangô ordena que todos os seus súditos busquem água na fonte sagrada para Oxalá. E assim, o velho saciado e seu filho, o forte Xangô, encantados de estarem juntos, voltam para casa de Ogum, onde são recebidos com um enorme banquete. Xangô teve vontade de vingar-se das pessoas que prenderam e prejudicaram seu pai, mas Oxalá interveio e perdoou a todos.

Alguns dizem que este ítan (mito) explica os porque das duas cores de Xangô: além do vermelho, como Senhor do fogo, recebeu também o branco, como recompensa por haver carregado Oxalufã, Orixá da alvura e da pureza. Contam ainda que foi devida a esta passagem que surgiu a cerimônia Águas de Oxalá, que é o ritual de lavação das escadarias da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim, na Bahia. Uma das características da cerimônia é o Obô que consiste em milho branco cozido sem sal, ao qual algumas tribos africanas acrescentam limo da costa. Obô foi o prato de sustentação no banquete oferecido no regresso se Oxalufã para a casa de Ogum. O milho utilizado no preparo do Obô é triturado no pilão de Xangô.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

O Permanente e o Provisório

O casamento é permanente, o namoro é provisório. 
O amor é permanente, a paixão é provisória. 
Uma profissão é permanente, um emprego é provisório. 
Um endereço é permanente, uma estada é provisória. 
A arte é permanente, a tendência é provisória. 
De acordo? Nem eu. 

Um casamento que dura 20 anos é provisório. Não somos repetições de nós mesmos, a cada instante somos surpreendidos por novos pensamentos que nos chegam através da leitura, do cinema, da meditação. O que eu fui ontem, anteontem, já é memória. Escada vencida degrau por degrau, mas o que eu sou neste momento é o que conta, minhas decisões valem pra agora, hoje é o meu dia, nenhum outro. 

Amor permanente... como a gente se agarra nesta ilusão. Pois se nem o amor pela gente mesmo resiste tanto tempo sem umas reavaliações. Por isso nos transformamos, temos sede de aprender, de nos melhorar, de deixar pra trás nossos imensuráveis erros, nossos achaques, nossos preconceitos, tudo o que fizemos achando que era certo e hoje condenamos. O amor se infiltra dentro de nós, mas seguem todos em movimento: você, o amor da sua vida e o que vocês sentem. Tudo pulsando independentemente, e passíveis de se desgarrar um do outro. 

Um endereço não é pra sempre, uma profissão pode ser jogada pela janela, a amizade é fortíssima até encontrar uma desilusão ainda mais forte, a arte passa por ciclos, e se tudo isso é soberano e tem valor supremo, é porque hoje acreditamos nisso, hoje somos superiores ao passado e ao futuro, agora é que nossa crença se estabiliza, a necessidade se manifesta, a vontade se impõe – até que o tempo vire. 

Faço menos planos e cultivo menos recordações. Não guardo muitos papéis, nem adianto muito o serviço. Movimento-me num espaço cujo tamanho me serve, alcanço seus limites com as mãos, é nele que me instalo e vivo com a integridade possível. 
Canso menos, me divirto mais, e não perco a fé por constatar o óbvio: tudo é provisório, inclusive nós.

Martha Medeiros.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Candomblé: Oyá Ìgbàlé

A palavra Ìgbàlè significa pequena mata, lugar sagrado; tem a conotação de “A Floresta Sagrada dos Egúnguns” ou “O Bosque Sagrado dos Ancestrais”. O mito relata que em épocas muito remotas, havia na cidade do Oyó um fazendeiro chamado Alapini, que tinha três filhos, Ojéwuni, Ojésamni e Ojérinlo. Um dia Alapini foi viajar e recomendou os filhos para que colhessem os inhames e os armazenassem, mas que não comessem um tipo especial de inhame chamado ihobia, pois ele causava uma terrível sede. Seus filhos ignoraram o aviso e o comeram em demasia. Depois, beberam muita água e, um a um, acabaram todos morrendo.
Quando Alapini retornou, encontrou a desgraça em sua casa. Desesperado, correu ao Babalawo, que consultou o oráculo de Ifá. O sacerdote aconselhou que, após o l7º dia fosse ao ribeirão do bosque e executasse o ritual que foi prescrito no jogo. Ele deveria escolher um galho da árvore sagrada atori e fazer um “bastão de invocação”, do qual deveria ser denominado de isan. Na margem do ribeirão, deveria bater com o bastão na terra e chamar pelos nomes dos seus filhos, que na terceira vez eles apareceriam. Mas ele também não poderia esquecer de antes fazer alguns sacrifícios e oferendas.
Assim ele fez e seus filhos apareceram. Mas eles tinham rostos e corpos estranhos, era então preciso cobri-los para que as pessoas pudessem vê-los sem assustarem-se. Pediu a seus filhos que permanecessem na floresta e voltou à cidade. Contou o fato ao povo, e as pessoas fizeram roupas para ele vestir seus filhos.
Deste dia em diante ele poderia ver e mostrar os filhos às outras pessoas, as belas roupas que eles ganharam escondiam perfeitamente suas condições de mortos. Alapini e seus filhos fizeram um pacto: em um buraco feito na terra pelo seu pai, deveria ser “acomodado” os fundamentos do culto e denominado de ojúbo (altar), no mesmo local do primeiro encontro, ou seja, no Igbó Ìgbàlè, ali seriam feitas as oferendas e os sacrifícios e onde as roupas deveriam ser guardadas, para que eles as vestissem quando o pai os chamasse através do ritual do bastão.
Seguindo o pacto e as instruções do Babalawo, de que sempre que os filhos morressem fosse realizado o ritual após o l7º dia, pai e filhos para sempre se encontraram. E, para os filhos que ainda não tiverem roupas, é só pedir às pessoas que elas farão com imenso prazer.
Assim sendo, poderíamos interpretar Oyá Ìgbàlè como “A Senhora da Floresta Sagrada dos Ancestrais”.  Se um dos atributos de Oyá em sua pura essência é o “Espírito do Vento”, neste caminho ela é denominada de “O Vento da Morte”, “A Regente do Vento Invisível dos Egúngun”. Oyá Ìgbàlè é a divindade à qual Olodumaré outorgou o direito de controlar os espíritos dos seres humanos quando desencarnados. Ela tem que assegurar que nosso espírito, de uma forma ou de outra, não seja prejudicado nesta “transição” tão delicada. Esta transição esta sub dividida em 9 etapas: leito de morte, velório, caminho do cemitério, porta do cemitério, caminho da sepultura, sepultura, ritos fúnebres, despacho do carrego e o caminho para o além; e caso este espírito tenha que regressar ao mundo dos vivos, para solucionarmos alguma pendência, novamente deverá ser acompanhado por Oyá Ìgbàlè. Há quem diga que o conhecido Déjà Vu pertence a esta entidade.
Oduleke foi o primeiro caçador a receber os ritos do Asese, celebrado por Oyá Ìgbàlè. Até então este rito era somente destinado aos caçadores, para somente depois ser designado a todos os iniciados e consagrados ao Culto do Orixá e Egun.
Uma de suas principais características é a lealdade com seus seguidores. Quando Oyá Ìgbàlè acompanha seus protegidos em uma batalha, invoca seu poderoso exército de Egúngun liderado por um dos mais temíveis Ancestrais, Baba Ajimuda. Os mitos relatam que nesta batalha Oyá Ìgbàlè cobre o rosto com uma mascara para ocultar a face da destruição. Na diáspora, esta máscara foi substituída pela pintura de efun, que cobre por completo o rosto de Oyá, dizem que ninguém deve dirigir o olhar diretamente à ela, mesmo que esta cerimônia seja realizada no escuro.
No Novo Mundo Oyá Ìgbàlè passa a morar no Ylê Awo, (A casa do Segredo), mais especificamente no Ylê Sanyin ou popularmente conhecido com Lesanyin, quando cultuada no Lese Egún e no Ylê Ibo Aku quando cultuada em Lese Orixá. Sua representação material e seus atributos diferem de um lugar para o outro, porém seu maior segredo se mantém em ambos os cultos. Entre tantos outros, o que mais diferencia seus assentamentos, são a presença de uma ossada retirada do corpo de um animal, que deverá ser preparada e consagrada para determinadas funções.
Oyá é evocada para proteção contra ataques de perversos ou Iku Egun, para atrair amores, fertilidade na esterilidade, saúde das trompas, vendas de todos os tipos, melhorias no comércio, movimento de comércios, atrair clientes, tomar iniciativas, limpeza espiritual e para varrer os espíritos perversos.

Oxum

No decorrer do vídeo você ouve "Canto de Oxum", na voz de Maria Bethânia e "É d'Oxum" na voz de Gerônimo.

sábado, 25 de junho de 2011

Os Muitos Títulos de Ogum

Ogum vivia com sua mãe, Yemanjá, em um castelo nas profundezas do mar. Cansado dessa vida, resolveu sair em busca de algo adequado ao seu temperamento. Pediu licença à ela e partiu. Já em terra, caminhava por meio da floresta quando sentiu fome. Sentou-se embaixo de uma árvore e viu animais correndo. Logo fez uma lança de madeira e caçou o seu primeiro animal. Após prepará-lo da forma como gostava, ele comeu e sentiu suas forças se revigorarem. Por este ato de caça, recebeu o título de Ogum Olóde (Senhor dos Caçadores). Ensinou esta tática ao irmão Oxóssi, porque com seu temperamento não dava para ficar esperando pelos animais. Mais adiante, Ogum tropeçou numa pedra, que nada mais era do que minério de ferro. Pegou-o e viu que era consistente e ideal para servir como arma de luta. Preparou uma forja e modelou o minério em forma de espada. Produziu também outras ferramentas que serviram para trabalhar melhor na lavoura. A este minério, Ogum deu o nome de Irin (ferro), e por isso ficou conhecido como Babá Irin (Pai do Ferro). Iniciou-se uma guerra, e os Orixás necessitavam de ajuda. Oromilaia pediu que Xangô chamasse seu irmão mais velho para que ele derrotasse os inimigos, pois ele tinha os segredos da guerra e também das armas. Ogum relutou mas cedeu aos pedidos de Xangô. Na guerra, Ogum destacou-se por sua bravura, liquidando os inimigos com sua espada e saciando sua sede com o sangue de seus adversários. Logo a notícia se espalhou e o povo, ao ver Ogum retornando, passou a chamá-lo de Ògún Aiaká Gbamu Èjè, que significa: Ogum recebe e toma o sangue. Com a vitória de Ogum, ele foi novamente chamado para outra tarefa. Desta vez, era a tomada da cidade de Ìré. Ele teve de destruir primeiro as sete cidades que cercavam e defendiam o povo de Ìré, o que o fez ser chamado de Ògún Méjèèjè e, mais tarde, ao entrar vitorioso na cidade, foi aclamado como Ògún Onirê (Rei de Iré). Deixou seu filho, Ògúndahunsi, no governo das novas terras conquistadas, e voltou à cidade. Passou a trabalhar com muita atividade em sua forja, sempre acesa, pois precisava fabricar mais armamentos e ferramentas de trabalho para atender aos pedidos vindos de todas as regiões. Ogum vestia-se com um avental de couro quando estava em seu trabalho, na forja de metais, e o povo passou a chamá-lo de Ògún Alágbéde, o ferramenteiro, o senhor da forja. Esta demonstração de arte no manuseio do fogo com o objetivo de fazer a liga dos metais necessários o fez dizer diversas vezes a expressão Orò mi’ná(n), que quer dizer: Meu ritual é o fogo. Os pedidos passaram a ser tantos, devido às vitórias obtidas com sua espada invencível, que Ogum chamou seu irmão, Exú, para ajudá-lo nas tarefas. Porém Exú começou a criar problemas e Ogum teve de acorrentá-lo a suas próprias pernas. Devido a isto, Exú só ia onde Ogum fosse. Acontece que Ogum foi chamado para comparecer a dois lugares diferentes, no mesmo dia e na mesma hora. Então ele pediu a Exú que fosse a um deles e que se fizesse passar por ele. Combinou que quando batesse palmas, Exú deveria voltar rapidamente. Assim, Ogum partiu para um lado e sei irmão para o outro. O povo, pensando que era Ogum que estava em dois lugares ao mesmo tempo, denominou-o Ògún Aláméji (O dono das duas espadas). Depois de algum tempo, quando Ogum estava seguindo para um outro trabalho, os cães que existiam na região começaram a avançar sobre ele, latindo sem parar. Furioso, ele bateu palmas, mas Exú não apareceu. Ogum então se pôs em fuga em direção à montanha, com os cães perseguindo-o. Ele cada vez mais bravo, começou a dilacerar e matar os cães com os dentes. E o povo, vendo aquilo, exclamou: “Ògúnjá!”, uma contração da frase “Ògún je aja”, que significa: “Ogum come cachorro”. A multiplicidade do panteão de divindades pode ser explicada através deste mito. A fusão de culturas e os feitos heróicos proporcionam codinomes e títulos anexados às divindades, motivando individualizações. Foram criadas assim “novas qualidades” ou “novos caminhos” dos Orixás atrelados ao Orixá principal.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Avânia

Olá pessoal!!! Hoje trago a vocês mais um vídeo de Avânia. Neste todos os Orixás estão representados, é muito bonito, vale a pena assistir.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Candomblé: Vamunha (Avânia)

Vamunha é um ritmo, também conhecido por ramonha, vamonha, avamunha, avania ou avaninha, tocado para todos os Orixás. É um toque rápido, empolgado e tocado em situações específicas como a entrada e saída dos filhos de santo no barracão e para a retirada do Orixá incorporado. É nesse momento que o Orixá saúda os pontos de axé da casa e se retira sob a aclamação dos presentes. Confira no vídeo abaixo uma apresentação com 3 bailarinos, no qual representam Ogum, Oxóssi e Oxum.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Ogum Revela o Segredo do Ferro

Os Orixás e o povo estavam vivendo na Terra criada por Oxalá, onde todos exerciam tarefas como caçar, arar a terra para a agricultura, plantar e construir casas para abrigo de suas famílias. Tudo era feito com muita dificuldade por falta de ferramentas adequadas para o trabalho e, agora mais ainda, pois as distâncias aumentavam, a cidade crescia para o lado das montanhas, com seus terrenos desnivelados por gigantescas rochas com caminhos inacessíveis. 
Olhando o que tinha feito e o que estava por fazer, os Orixás discutiam a melhor solução para o problema. Diziam: "Deixe um de nós começar a tarefa, derrubando as árvores e limpando a terra. Depois poderemos plantar em nossos campos". Todos concordaram, exceto Olókun: "O meu domínio é a água. A terra e as árvores não são meus afazeres". 
Ossanha, o Orixá das folhas, disse: "Eu limparei primeiro os campos". E pegou sua faca do mato, e partiu para as árvores, começando seu trabalho. Mas sua faca era feita de madeira e pedra, e assim, ele não conseguia fazer o corte necessário. Após algum tempo de uso, ela quebrou. Ossanha retornou e disse para os demais companheiros: "Eu comecei o trabalho, mas a madeira era tão dura que partiu minha faca". 
 Orixá Okô, senhor dos campos livres, falou: "Minha faca é mais forte, cortarei as árvores e destruirei as rochas". Em seguida partiu para o trabalho, mas não conseguiu executá-lo como queria, pois a sua ferramenta não suportou a árdua tarefa. Disse então: "Aconteceu o mesmo comigo, minha faca está cega e retorcida". 
Depois Exú com seu corpo potente, armou-se com suas ferramentas e foi para o meio da floresta. Lá permaneceu por um longo tempo e quando retornou, seu semblante estava amarrado: "Limpei a terra e desloquei as rochas, mas o metal de minhas armas não é forte o suficiente para tal empreitada". Um a um, os Orixás tentaram, mas não conseguiram fazer o que pretendiam. "Em que espécie de lugar estamos vivendo? Como poderemos sobreviver aqui?". 
Até aquele momento, o único Orixá que se manteve calado foi Ogum, que observava todo o movimento sem nada dizer. Somente quando todos já haviam tentado, ele levantou de onde estava e disse: "Nísisìyí àsìkò mi ni". ("Agora é a minha vez"). Partiu para o campo. Executou o corte das árvores necessárias para a abertura dos caminhos; com potentes golpes destruiu as rochas, enquanto outras foram deslocadas para manter a terra livre das pedras. Toda a terra foi arada, amaciada e semeada. Deu novos caminhos, enquanto ia eliminando plantas desnecessárias. Ogum trabalhou até o final da tarde ininterruptamente. Quando terminou sua obra, retornou para junto dos demais Orixás que o aguardavam. Lá chegando exibiu suas armas e ferramentas utilizadas. Estavam afiadas e intactas. 
Diante do que viam, perguntaram: "Que metal esplêndido é este?" Ogum respondeu: "O segredo desse metal me foi dado por Olodumaré. Chama-se Irin, o ferro". Os Orixás olhavam as ferramentas de Ogum com muita admiração, dizendo: "Se tivéssemos o conhecimento do ferro, nada para nós seria difícil". Ogum observou o interesse de todos, mas relutou em ensinar seu segredo. "Olodumaré não me autorizou", disse. Mas não se negou a fazer armas e ferramentas a quem lhe pedisse. Para isso, construiu uma forja em sua casa e passou a fabricar os diversos tipos de armas e instrumentos de trabalho, pois ele além de guerreiro, era um grande caçador. A caça, até aquela época, era efetuada com armadilhas e armas bem leves, além de se contar com muita sorte nas empreitadas. 
A relutância de Ogum continuava a incomodar os demais, que embora estando com as novas armas criadas por ele, insistiam em conhecer o segredo de sua fabricação. Pensando no assunto, todos tomaram a iniciativa entitulá-lo Osinmalè, o Chefe dentre as Divindades (Osìn: chefe; irúnmalè: divindade). Considerando tudo isso, Ogum concordou com o pedido de todos. Passou a ensinar o processo de fabricação da liga dos metais, a criação de armadilhas, ferramentas, lanças, espadas e facas. 
Em pouco tempo, todos os Orixás eram possuidores do conhecimento do uso do ferro. E vieram pessoas de outras regiões para aprender, e ele ensinou tudo a todos. Embora Ogum tivesse aceito o cargo de chefia que lhe fora dado pelos Orixás, ele continuava a ser o grande caçador que era, pois muitos dependiam de sua capacidade para sobreviver. E assim, embrenhava-se floresta adentro a fim de caçar os animais de que tanto gostava. Vestia-se com roupas de couro presas por màrìwò, equipava-se com as armas de luta e seguia seu caminho. 
A atividade de caçador era muito árdua, obrigando-o a ficar isolado por vários dias, dormindo sobre a terra ou em árvores. Ele abatia muitos animais, em constantes lutas. Quando saía da floresta, estava sujo, seu cabelo, embaraçado, e as peles que vestia ficavam rasgadas e manchadas do sangue de sua caça. Seguia o caminho de volta à cidade para reencontrar seus companheiros. 
Certo dia, os Orixás, ao verem Ogum chegando daquele jeito, disseram: "Quem é este estranho todo sujo que vem da floresta? Certamente não é Ogum, o qual indicamos para ser nosso chefe". Eles ficaram descontentes com Ogum e continuaram: "Um chefe deveria se manter com dignidade, suas roupas deveriam ser limpas, e seu cabelo bem aparado. Você está indistinguível do mais humilde caçador de Ifé, e o ar à sua volta está empesteado de carne morta". Dizendo isso, concluíram: "O cargo que lhe demos, o tiramos agora. Você não é mais nosso chefe". 
Ogum ouvindo aquilo replicou: "Quando vocês precisaram do segredo do ferro, souberam implorar-me para ser o chefe de todos. Agora que já são possuidores do poder, dizem que eu cheiro mal". Falando isso, ele foi até o rio mais próximo, tirou suas roupas sujas de pele de animal e banhou-se. Quando já estava limpo, vestiu suas roupas de màrìwò (folhas de dendezeiro depois de desfiadas mediante um ritual específico), pegou suas armas e partiu para a cidade de Ìré. Construiu uma casa embaixo de uma árvore de akòko, e lá permaneceu solitário, mas fiel aos seus compromissos de se manter vigilante nas terras de Ilé Ifé.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Promoção

Olá Amigos!!! O Blog irá presentear um dos leitores com uma camiseta de Oxum, igual a esta que vocês vêem acima. A camiseta vem no tamanho G. Para concorrer basta seguir o blog, clicando em Seguir, no início da página, do lado direito do primeiro post. O sorteio será realizado no dia 08 de julho de 2011.
Quem não ganhar não precisa desanimar, pois esta é apenas a primeira promoção.
Participem!!!! Abraços a todos e muito Axé.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Candomblé: Onilé


Onilé é uma divindade feminina relacionada aos aspectos essenciais da natureza, e originalmente exercia seu patronato sobre tudo o que se relaciona à apropriação da natureza pelo homem, o que inclui a agricultura, a caça, a pesca e a própria fertilidade. Com as transformações da sociedade Yorubá numa sociedade patriarcal ou patrilinear, que implicou a constituição de linhagens e clãs familiares fundados e chefiados por antepassados masculinos, as mulheres perderam o antigo poder que tiveram numa primeira etapa (um mito relata que, numa disputa entre Oyá e Ogum, os homens teriam arrebatado o poder que era antes de domínio das mulheres). Os antepassados divinizados tomaram o lugar das divindades primordiais e houve uma nova divisão de trabalho entre os Orixás. As divindades femininas antigas tiveram então seu culto reorganizado em torno de entidades femininas genéricas, as Iyami Oxorongás, consideradas bruxas maléficas pelo fato de representarem sempre um perigo para o poder masculino. Vários Orixás tiveram divididas entre si as atribuições de zelar pela Terra: o subsolo ficou para Olwuaye e para Ogum, o solo para Orixá Oko e Ogum, a vegetação e a caça para os Odés e Ossanha e assim por diante. A fertilidade das mulheres foi o atributo que restou às divindades femininas, já que é a mulher quem dá a luz, que reproduz e dá continuidade à vida. Constituiriam-se elas então em Orixás dos rios, representando a própria água, que fertiliza a terra e permite a vida: são as Yabás Oxum, Yemanjá, Obá, Oyá, Ewá e também Nanã, que como antiga divindade da terra, representa a lama do fundo do rio, simbolizando a fertilização da terra pela água.
Onilé teve seu culto preservado na África, mas perdendo muitas das antigas atribuições. Hoje ela representa nossa ligação elemental com o planeta em que vivemos, nossa origem primitiva. É a base de sustenção da vida, é o nosso mundo material. Embora sua importância seja crucial do ponto de vista da concepção religiosa de universo, os devotos a ela pouco recorrem, pois seu culto não trata de aspectos particulares do mundo e da vida cotidiana, preferindo cada um dirigir-se aos Orixás que cuidam desses aspectos específicos. Na Nigéria mantém-se viva a ideia de que Onilé é a base de toda a vida, tanto que, quando se faz um juramento, jura-se por Onilé. Nessas ocasiões, é ainda costume pôr na boca alguns grãos de terra, às vezes dissolvida na água que se bebe para selar o juramento, para lembrar que tudo começa com Onilé, a Terra Mãe, tanto na vida como na morte.
Um mito ensina qual é a atribuição principal de Onilé, como ela está associada ao chão que pisamos e sobre o qual vivemos, nosso mundo material. Assim conta o mito:

Onilé era a filha mais recatada e discreta de Olodumaré. Vivia trancada na casa do pai e quase ninguém a via. Quase nem se sabia de sua existência. Quando os Orixás, seus irmãos se reuniam no palácio do grande Pai para as grandes audiências, em que Olodumaré comunicava suas decisões, Onilé fazia um buraco no chão e se escondia, pois sabia que as reuniões sempre terminavam em festa, com muita música e dança ao ritmo dos atabaques. Onilé não se sentia bem no meio dos outros. Um dia o grande deus mandou os seus arautos avisarem: haveria uma grande reunião no palácio e os Orixás deviam comparecer ricamente vestidos, pois ele iria distribuir entre os filhos as riquezas do mundo e depois haveria muita comida, música e dança. Por todos os lugares os mensageiros gritaram esta ordem e todos se prepararam com esmero para o grande acontecimento. Quando chegou por fim o grande dia, cada Orixá dirigiu-se ao palácio na maior ostentação, cada um mais belamente vestido do que o outro, pois este era o desejo de Olodumaré. Yemanjá chegou vestida com a espuma do mar, os braços ornados de pulseiras de algas marinhas, a cabeça cingida por um diadema de corais e pérolas e o pescoço emoldurado por uma cascata de madrepérolas. Oxóssi escolheu uma túnica de ramos macios, enfeitada de peles e plumas dos mais exóticos animais. Ossanha vestiu-se com um manto de folhas perfumadas. Ogum preferiu uma couraça de aço brilhante, enfeitada com tenras folhas de palmeira. Oxum escolheu cobrir-se de ouro, trazendo nos cabelos as águas verdes dos rios. As roupas de Oxumaré mostravam todas as cores, trazendo nas mãos os pingos frescos da chuva. Iansã escolheu para vestir-se um sibilante vento e adornou os cabelos com raios que colheu da tempestade. Xangô não deixou por menos e cobriu-se com o trovão. Oxalá trazia o corpo envolto em fibras alvíssimas de algodão e a testa ostentando uma nobre pena vermelha de papagaio. E assim por diante.
Não houve quem não usasse toda a criatividade para apresentar-se ao grande pai com a roupa mais bonita. Nunca se vira antes tanta ostentação, tanta beleza, tanto luxo. Cada Orixá que chegava ao palácio de Olodumaré provocava um clamor de admiração, que se ouvia por todas as terras existentes. Os Orixás encantaram o mundo com suas vestes. Menos Onilé.
Onilé não se preocupou em vestir-se bem, não se interessou por nada, não se mostrou para ninguém e recolheu-se a uma funda cova que cavou no chão. Quando todos os Orixás haviam chegado, Olodumaré mandou que fossem acomodados confortavelmente, sentados em esteiras dispostas ao redor do trono. Ele disse então à assembléia que todos eram bem vindos. Que todos os filhos haviam cumprido seu desejo e que estavam tão bonitos que ele não saberia escolher entre eles qual seria o mais vistoso e belo. Tinha todas as riquezas do mundo para dar a eles, mas nem sabia como começar a distribuição. Então Olodumaré disse que os próprios filhos, ao escolherem o que achavam o melhor da natureza, para com aquela riqueza se apresentar perante o pai, eles mesmos já tinham feito a divisão do mundo. Então Yemanjá ficava com o mar, Oxum com o ouro e os rios. A Oxóssi deu as matas e todos os seus bichos, reservando as folhas para Ossanha. Deu à Iansã os raios e a Xangô o trovão. Fez Oxalá dono de tudo que é branco e puro, de tudo que é o princípio, deu-lhe a criação. Destinou a Oxumaré o arco íris e a chuva. A Ogum deu o ferro e tudo o que se faz com ele, inclusive a guerra. E assim por diante. Deu a cada Orixá um pedaço do mundo, uma parte da natureza, um governo particular. Dividiu de acordo com o gosto de cada um. E disse que a partir de então, cada um seria o dono e governador daquela parte da natureza. Assim, sempre que um humano tivesse alguma necessidade relacionada com uma daquelas partes da natureza, deveria dar uma oferenda ao Orixá que a possuísse. Pagaria em oferendas de comida, bebida ou outra coisa que fosse da predileção do Orixá. Os Orixás, que tudo ouviram em silêncio, começaram a gritar e a dançar de alegria, fazendo um grande alarido na corte. Olodumaré pediu silêncio, ainda não havia terminado. Disse que faltava ainda a mais importante das atribuições. Que era preciso dar a um dos filhos o governo da Terra, o mundo no qual os humanos viviam e onde produziam as comidas, bebidas e tudo o mais que deveriam ofertar aos Orixás. Disse que dava a Terra a quem se vestia da própria Terra. Quem seria? perguntavam-se todos? "Onilé", respondeu Olodumaré. "Onilé?", todos se espantaram. Como, se ela nem sequer viera à grande reunião? Nenhum dos presentes a vira até então. Nenhum sequer notara sua ausência. "Pois Onilé está entre nós", disse Olodumaré e mandou que todos olhassem no fundo da cova, onde se abrigava, vestida de terra, a discreta e recatada filha. Ali estava Onilé, em sua roupa de terra. Onilé, a que também foi chamada de Ilê, a casa, o planeta. Olodumaré disse que cada um que habitava a Terra pagasse tributo a Onilé, pois ela era a Mãe de todos, o abrigo, a casa. A humanidade não sobreviveria sem Onilé. Afinal, onde ficava cada uma das riquezas que Olodumaré partilhara entre seus filhos Orixás? "Tudo está na Terra", disse Olodumaré. "O mar e os rios, o ferro e o ouro, os animais e as plantas, tudo", continuou. "Até mesmo o ar e o vento, a chuva e o arco íris, tudo existe porque a Terra existe, assim como as coisas criadas para controlar os homens e os outros seres vivos que habitam o planeta, como a vida, a saúde, a doença e mesmo a morte".Pois então, que cada um pagasse tributo a Onilé, foi a sentença final de Olodumaré. Onilé, Orixá da Terra, receberia mais presentes que os outros, pois deveria ter oferendas dos vivos e dos mortos, pois na Terra também repousam os corpos dos que já não vivem. Onilé, também chamada Aiê, a Terra, deveria ser propiciada sempre, para que o mundo dos humanos nunca fosse destruído. Todos os presentes aplaudiram as palavras de Olodumaré. Todos os Orixás aclamaram Onilé. Todos os humanos propiciaram a mãe Terra. E então Olodumaré retirou-se do mundo para sempre e deixou o governo de tudo por conta de seus filhos. Assim, este mito de modo didático e com muita beleza, situa o papel de Onilé no panteão dos deuses Yorubás. Como é estrutural nos mitos, o tempo da narrativa não é histórico, dando a impressão de que os cultos dos diferentes Orixás foram instituídos a um só tempo, num só ato do supremo Deus. A narrativa enfatiza, contudo, a concepção básica da religião dos Orixás, isto é, que cada Orixá é um aspecto da natureza, uma dimensão particular do mundo em que vivemos. Eles são o próprio mundo, com suas forças, elementos, energias e propriedades. Mundo este que tem por base Onilé, a Terra, o planeta que habitamos, o nosso lar no universo. Na África Yorubá, Onilé ocupa lugar central no culto da sociedade masculina secreta Ogboni. Louvar Onilé é celebrar as origens. Por isso, quando aparecem junto aos humanos, os antepassados egunguns saúdam Onilé, lembrando-nos que ela é anterior a tudo, mesmo às linhagens mais antigas da humanidade. Onilé é assentada num montículo de terra vermelha, que representa o coração da Terra, que é trazida de dentro do solo pelas formigas. Há uma quartinha com água, pois não há vida na Terra desprovida de água. A quartinha dentro da terra simboliza que a água vem de dentro da Terra e que é assim a primeira dádiva de Onilé.
A água que jorra do solo, forma os regatos, rios, lagos e o próprio mar, de onde sobe para as nuvens e se precipita em chuva, voltando ao solo e subsolo, num ciclo permanente de propiciação da vida. O assentamento é coberto com moedas e búzios, que entre os antigos iorubanos era dinheiro, representando toda a riqueza e prosperidade que está na Terra, que dela extraímos e na qual vivemos. Vermelho e marrom, cores da terra, são as contas apropriadas para colares que homenageiam Onilé. Na África, os sacrifícios feitos a Onilé incluem caracóis, aves fêmeas e tartarugas (Abimbola, 1977: 111). No Brasil, a legislação pune como crime inafiançável o sacrifício de animais ameaçados de extinção e, por isso, a tartaruga é substituída pela cabra. Aliás, matar um animal em extinção seria uma ofensa imperdoável à Onilé, que é a própria natureza, a grande Mãe da ecologia. Além desses animais, dá-se para Onilé tudo o que a terra produz e que o homem transforma: obis, orobôs e todas as demais frutas, inhame e outros tubérculos, feijões, milho, favas, mel, dendê, sal, vinho e tudo mais que vem da terra pela mão do homem. Onilé, isto é, a Terra. Tem muitos inimigos que a exploram e podem destruí-la. Para muitos seguidores da religião dos Orixás, interessados em recuperar a relação Orixá-natureza, o culto de Onilé representaria a preocupação com a preservação da própria humanidade e de tudo que há em seu mundo. Pois é Onilé quem guarda o planeta e tudo que há sobre ele, protegendo o mundo em que vivemos e possibilitando a própria vida de tudo o que vive: as plantas, os bichos e a humanidade.
 Autor: Mogba Klaudio -  Gazeta Mogba News (com adaptações).

domingo, 12 de junho de 2011

Vovó Catarina

Os tambores tocavam o ritmo cadenciado dos Orixás, e nós dançávamos. Dançávamos todos em volta da fogueira improvisada ou à luz de tochas ou velas de cera que fazíamos. A comida era pouca, mas para passar a fome nós dançávamos a dança dos Orixás. E assim, ao som dos tambores de nosso povo, nos divertíamos, para não morrer de tristeza e sofrimento. Eu era chamada de feiticeira. Mas eu não era feiticeira, era curandeira. Entendia de ervas, com as quais fazia remédios para o meu povo, e de parto; eu era a parteira do povo de Angola, que estava errando naquela terra de meu Deus. Até que Sinhazinha me tirou do meu povo. Ela não queria que eu usasse meus conhecimentos para curar os negros, somente os brancos; afinal, negro - dizia ela - tinha que trabalhar e trabalhar até morrer. Depois, era só substituir por outro. Mas Dona Moça não pensava assim. Ela gostava de mim, e eu, dela. Fui jogada num canto, separada dos outros escravos, e todas as noites eu chorava ao saber que meu povo sofria e eu não podia fazer nada para ajudar. De dia eu descascava coco e moía café no pilão. À noite eu cantava sozinha, solitária. E ouvia o cantar triste de meu povo, de longe. Ouvia o lamento dos negros de Angola pedindo a Oxalá a liberdade, que só depois nós entendemos o que era. E os tambores tocavam o seu lamento triste, o seu toque cadenciado, enquanto eu respondia de meu cativeiro com as rezas dos meus Orixás. A liberdade, que era cantada por todos do cativeiro, só mais tarde é que nós a compreendemos. A liberdade era de dentro, e não de fora.
Aqueles eram dias difíceis, e nós aprendemos com os cânticos de Oxóssi e as armas de Ogum o que era se humilhar, sofrer e servir, até que nosso espírito estivesse acostumado tanto ao sofrimento e a servir sem discutir, sem nada obter em troca, que, a um simples sinal de dor ou qualquer necessidade, nós estávamos ali, prontos para servir, preparados para trabalhar. E nosso Pai Oxalá nos ensinou, em meio aos toques dos tambores na senzala ou aos chicotes do capitão, que é mais proveitoso servir e sofrer do que ser servido e provocar a infelicidade dos outros.
Um dia, vítima do desespero de Sinhá, eu fui levada à noite para o tronco, enquanto meus irmãos na senzala cantavam. A cada toque mais forte dos tambores, eu recebia uma chibatada, até que, desfalecendo, fui conduzida nos braços de Oxalá para o reino de Aruanda. Meu corpo, na verdade, estava morto, mas eu estava livre, no meio das estrelas de Aruanda. Em meu espírito não restou nenhum rancor, mas apenas um profundo agradecimento aos meus antigos senhores, por me ensinar, com o suor e o sofrimento, que mais compensa ser bom do que mau; sofrer cumprindo nosso dever do que sorrir na ilusão; trabalhar pelo bem de todos do que servir de tropeço. Eu era agora liberta, e nenhum chicote, nenhuma senzala poderia me prender, porque agora eu poderia ouvir por todo lado o barulho dos tambores de Angola, mas também do Kêtu, de Luanda, de Jêje e de todo lugar. Em meio às estrelas de Aruanda eu rezava. Rezava agradecida ao meu Pai Oxalá.
Fui pra Aruanda, lugar de muita paz! Mas eu retornei. Pedi a meu Pai Oxalá que desse oportunidade pra eu voltar ao Brasil, reencarnar pra poder ajudar a Sinhá, pois ela me ensinou muita coisa com o jeito dela nos tratar. E eu voltei. Agora as coisas pareciam mudadas. Eu não era aquela negra feia e escrava. Era filha de gente grande e bonita, sabia ler e ensinava as crianças dos outros. Um dia bateu na minha porta um homem com uma menina enjeitada da mãe. Era muito esquisita, doente e trazia nela o mal da lepra. Tadinha! Não tinha pra onde ir, e o pai desesperado não sabia o que fazer. Adotei a pobre coitada, fui tratando aos poucos e, quando me casei, levei a menina comigo. Cresceu, deu problema, mas eu a amava muito. Até que um dia ela veio a desencarnar em meus braços, de um jeito que dava dó. Quando eu desencarnei e retornei pra Aruanda, que vocês chamam de plano espiritual, ela veio me receber com os braços abertos e chorando muito, muito mesmo. Perguntei por que chorava, se nós duas agora estávamos livres do sofrimento da carne, então, ela, transformando-se em minha frente, assumiu a feição de Sinhazinha! Ela era a minha Sinhá do tempo do cativeiro. E nós duas nos abraçamos e choramos juntas. Hoje, trabalhamos nas falanges da Umbanda, com a esperança de passar a nossa experiência pra muitos que ainda se encontram perdidos em suas dificuldades.

Passagem extraída do livro "Tambores de Angola".

sábado, 11 de junho de 2011

Barril de Vinho


Nos Alpes Italianos existia um pequeno vilarejo que se dedicava ao cultivo de uvas para produção de vinho. Uma vez por ano, lá ocorria uma festa para comemorar o sucesso da colheita.
A tradição exigia que, nesta festa, cada morador do vilarejo trouxesse uma garrafa do seu melhor vinho, para colocar dentro de um barril que ficava na praça central.
Entretanto, um dos moradores pensou: "Porque deverei levar uma garrafa do meu mais puro vinho? Levarei uma cheia de água, pois no meio de tanto vinho o meu não fará falta". Assim pensou e assim fez.
No auge dos acontecimentos, como era de costume, todos se reuniram na praça, cada um com sua caneca, para pegar uma porção daquele vinho, cuja fama se estendia além das fronteiras do país.
Contudo ao abrir a torneira do barril, um silêncio tomou conta da multidão. Daquele barril saiu apenas água.
Como isso aconteceu?
Acontece que todos pensaram como aquele morador: "A ausência da minha parte não fará falta".
Nós somos muitas vezes conduzidos a pensar: "Tantas pessoas existem neste mundo que se eu não fizer a minha parte, isso não terá importância".
O que aconteceria com o mundo se todos pensassem assim?
Todos temos uma missão a cumprir, o melhor é tentar realizá-la da melhor maneira possível. Sempre amando, amparando e respeitando o próximo.
Autor desconhecido

quinta-feira, 9 de junho de 2011

A Divinização de Xangô

Nascido em Tápà, cidade que faz fronteira com o rio Níger, Xangô era filho de Oranmíyàn e Torosi, filha de Elenpe, rei de Tápà. Retornando mais tarde para a sua região, Oranmíyàn fundou a antiga cidade de Oyó, localizada próxima ao monte Àjàkà.Xangô passou sua infância e juventude em Tápà, mais tarde foi para outras cidades, conquistando uma delas, chamada Kosso, lá assumiu a condição de líder de seu povo como Oba (rei). Mas o sonho de Xangô era assumir o reinado de Oyó, que nessa época tinha como regente Dàda Àjàkà, seu irmão mais velho, que não estava à altura do cargo, por ser passivo e de certa forma indolente. Xangô invadiu Oyó e destronou o irmão, que se instalou na cidade de Ísele. Passou a ser o 3° Aláàfin (Título dos soberanos) de Oyó, permanecendo no trono durante sete anos, dando motivos a inúmeras histórias onde são reveladas suas façanhas e seus casos de lutas e paixões. Segue uma delas:

Xangô, como soberano de Oyó, assumiu o papel de guerreiro, pois essa fase, na vida do povo yorubá era dedicada a conquistas, e com isso conseguiu que seu reino se expandisse a ponto de se tornar o soberano legítimo reconhecido por todos. Seus exércitos haviam dominado todos os seus opositores e assim, todos os demais reis reconheceram a sua supremacia. Entre os guerreiros que participavam dos exércitos de Xangô, dois de destacavam: Tìmì e Gbonkaá Ébìrì, que eram conhecidos e respeitados por todos. Suas vitórias eram sempre lembradas, e isso passou a incomodar Xangô que dizia: “Sou o aláàfin de Oyó, o Oba dos Obas, e apesar de meus exércitos conquistarem tudo, não é só a mim que o povo elogia”. Pensou e começou a imaginar uma maneira de se livrar da força que os dois tinham juntos ao povo de Ifé. 
 No dia seguinte, enviou um mensageiro à casa de Tìmì, pedindo que comparecesse no palácio. Tìmì atendeu prontamente ao pedido e se fez acompanhar por um tocador de atabaque, cantando poemas em seu louvor. Uma multidão de pessoas o seguiu, algumas delas dançando, pois esta era a forma como as pessoas agiam quando um grande herói de deslocava de um lugar para outro. Xangô sentia-se agradecido pela lealdade de seu guerreiro nas batalhas, mas o ciúme e a gratidão conflitavam dentro dele. Assistir ao espetáculo das várias pessoas celebrando as grandes ações de Tìmì fez o coração de Xangô ficar endurecido e assim, decidir mandar Tìmì embora. 
Com esse pensamento, Xangô disse a Tìmì: “Na cidade de Edé as coisas não andam bem. Lá a população não demonstra o respeito necessário a Oyó. Vá, estabeleça a ordem e oprima aqueles que buscam a desordem. Permaneça lá e seja a autoridade de Edé”. Tìmì agradeceu a confiança e disse: “Grande Xangô, eu farei o que me pede. Edé voltará a ordem e será submissa a Oyó”. Em seguida foi para casa a fim de se preparar para a viagem. Levou seus amuletos no pescoço e nos braços, pegou o arco e as flechas flamejantes que usava nas batalhas e que o faziam tornar-se invencível, montou em seu cavalo, e com alguns guerreiros, iniciou sua viagem. Xangô pensou: “Agora me livrei de um dos heróis que, certamente, encontrará seu fim tentando conquistar Edé”. Entretanto as notícias começaram a chegar informando que Tìmì e seus companheiros haviam lutado e derrotado os melhores guerreiros, trazendo a ordem à cidade e à todas as regiões fronteiriças. O nome de Tìmì havia se tornado maior do que era antes e a cidade de Edé desenvolveu-se como potência militar poderosa, repercutindo fortemente em Oyó, deixando Xangô muito aborrecido.
Assim começou a arquitetar um grande plano. Mandou chamar o outro herói, Gbonkáà, e instruiu-o da seguinte forma: “Vá até Edé, onde Tìmì governa. Quando ele partiu daqui, prometeu tornar a cidade submissa a Oyó. Ao invés disso, ele a fez altiva e vaidosa, como se nossa cidade fosse uma aldeia sem nenhuma importância. Vá e derrote-o. Traga-o de volta, usando os seus poderes”.
Ouvindo tudo com atenção, Gbonkáà disse que não tinha raiva de Tìmì. E completou dizendo a Xangô: “Grande aláàfin, eu ouço o que quer que eu faça, mas lembre-se de que eu e Tìmì combatemos juntos. A dor de um sempre foi a dor do outro. Quando um de nós se feria, o outro ajudava. Aliviamos a nossa sede no mesmo copo. Como posso lutar contra Tìmì? Um de nós certamente morrerá”. Xangô respondeu que já havia pensado nisso e elogiou o poder de Gbonkáà, dizendo que ele era muito eficaz e que iria vencer sem causar nenhuma morte. O que Xangô tinha em mente era a certeza de que, quando os dois heróis se encontrassem em combate, certamente um deles morreria, e assim, ficaria mais fácil para ele enfrentar apenas um.
Gbonkáà afirmou: “Eu irei até Edé e conversarei com Tìmì como se fala com um companheiro de muitas batalhas. Eu o convencerei a voltar”. Dizendo isso, seguiu para a sua casa, carregando consigo seus talismãs. Pegou o seu chifre de antílope, no qual mantinha um de seus grandes poderes ligados a encantamento. Depois partiu, tendo à sua frente o tocador de atabaques cantando seus feitos e glórias.
Algum tempo depois, o povo de Edé começou a ouvir os cânticos e os sons do atabaque. Viram com admiração a chegada de Gbonkáà. Ele era forte e violento, e seu corpo estava quase todo coberto com sacolas de couro contendo a força de seus poderes. Na mão trazia uma lança e sob seu escudo estavam as marcas tradicionais de seus feitos. O povo correu até a casa de Tìmì, gritando que Gbonkáà havia chegado e estava trajando roupas para uma batalha. Tìmì o aguardou na porta de casa. Gbonkáà aproximou-se e disse: “Tìmì, meu companheiro de guerra, Xangô enviou-me até aqui para levá-lo de volta a Oyó. Peço que prepare-se para a viagem”. Tìmì respondeu: “Gbonkáà, você que percorreu comigo muitas regiões, está de volta a Edé; porém, não posso voltar com você, pois sou agora o Oba desta cidade. Quando Xangô mandou que eu viesse para cá, ele não disse para voltar. Portanto, não poderei acompanhá-lo”.
O diálogo estava sendo observado por toda a população, já preocupada com os acontecimentos. E, nesse clima, Gbonkáà respondeu: “Meu amigo, devo lhe dizer que Xangô me orientou para que no caso de você decidir não vir, deverei levá-lo à força ou lutar para decidir o caso”. Tìmì surpreendeu-se: "Gbonkáà, você teria coragem de usar suas armas contra mim? Eu sou seu companheiro e amigo de muitas batalhas". Embora lamentando, Gbonkáà foi irredutível: "Infelizmente terá de ser dessa maneira. Prepare-se, vamos lutar". Tìmì foi preparar-se. Cobriu-se com seus preparados e a proteção de seus talismãs. Em suas mãos, seu Ofá Iná, as flechas flamejantes.
O povo de Edé suplicava aos seus heróis: "Vocês são como irmãos. Pensem nisso e não lutem!" Mas Tìmì disse: "Afastem-se e não cheguem perto de nós". Não havendo outra solução, recuaram. Os tocadores de atabaques dos dois heróis começaram a cantar louvores. Tìmì colocou a sua flecha de fogo no arco, em posição de ataque. Gbonkáà atento, apenas segurou o seu chifre de antílope, onde trazia o seu poder de encantamento. E, enquanto fitava Tìmì, começou a recitar um determinado ofo (reza de encantamento), que terminava com as seguintes palavras:

Ewé ti a ba já lówó òtún 
(Folhas apanhadas do lado direito) 

Òtún níígbé 
(São conservadas na mão direita) 

Ewé ti a bá lówó òsì 
(Folhas apanhadas do lado esquerdo) 

Òsì níígbé 
(São conservadas na mão esquerda) 

A sùn fonfon ni tígi àjà 
(Uma trepadeira fica sempre imóvel) 

Ìwo, Tìmì! Sísùn ni kóosùn! 
(Você, Tìmì! Fique imóvel, durma, não acorde!) 

Imediatamente Tìmì entrou em sono profundo. Suas armas caíram de suas mãos e Gbonkáà aproximou-se dele com sua lança suspensa. Vendo Tìmì imóvel, abaixou-se e pediu ao povo para colocá-lo em cima de um cavalo, levando-o de volta para Oyó. Assim que chegou, foi direto para o palácio de Xangô e disse: "Nós nos preparamos para a luta, mas antes que ele pudesse atirar sua flecha eu o coloquei para dormir". Xangô pediu que o acordasse e, quando Tìmì levantou, o povo começou a ridicularizá-lo com frases debochadas e risadas. Gbonkáà dispersou o povo e seguiu calmamente para casa.
Xangô estava muito irritado, pois os dois heróis continuavam em Oyó. Pensou no assunto e mandou chamar Tìmì. "As coisas não estão bem", disse-lhe. "Pensei que você fosse derrotar Gbonkáà, mas aconteceu o contrário. Ele o fez dormir com o poder que possui e agora o povo zomba de você. Você não pode ficar ouvindo o povo humilhá-lo diariamente. Isso não pode continuar. Se você desejar, anunciarei uma nova luta entre vocês". As palavras tocaram fundo em Tìmì, que estava sufocado pela humilhação. Então, ele falou: "Sim, eu me encontrarei mais uma vez com Gbonkáà, e a morte deverá vir para um de nós". E um novo encontro foi anunciado entre os dois guerreiros. Lutariam até a morte na praça principal de Oyó.
Na manhã seguinte, todos já estavam reunidos conforme o desejo de Xangô. Os dois guerreiros, face a face, com seus tocadores cantando vitórias. Havia uma grande agitação. Tìmì atirou uma flecha flamejante de seu arco e, no exato momento em que a flecha iniciou sua trajetória, Gbonkáà apontou seu chifre de antílope para o Leste. A flecha então tomou o rumo do Leste. Tìmì lançou outra flecha flamejante, e Gbonkáà apontou seu talismã para o Oeste. E a flecha mudou de rumo novamente. Novas flechas foram atiradas, mas sempre desviadas pelo poder do talismã de Gbonkáà, contido dentro do chifre de antílope. Em meio a essa ação de defesa, Gbonkáà começou a entoar cânticos de encantamento para imobilizar Tìmì, e foi o que aconteceu. Tìmì caiu no sono, imóvel e em sono profundo. O povo fez alarido e os tocadores cantaram a vitória de Gbonkáà, que em seguida, despertou Tìmì e se afastou do combate.
O resultado da contenda, mais uma vez, não agradou Xangô porque ambos os heróis ainda permaneciam vivos. Mandou então, chamar Gbonkáà e lhe disse: "A árvore foi curvada, mas ainda continua a crescer. Você tem curvado Tìmì, mas ele ainda vive; portanto, você deverá lutar novamente".
Furioso com o que ouvia, Gbonkáà respondeu a Xangô: "Duas vezes eu lutei contra Tìmì para satisfazê-lo e duas vezes eu o derrotei. Isso não lhe tem agradado. Suponho que você nunca ficará satisfeito enquanto nós dois permanecermos vivos. Muito bem, lutarei a última vez com Tìmì. Depois, a luta será entre você e eu. Um de nós deverá deixar Oyó para sempre".
Deste modo, os dois heróis se defrontaram mais uma vez em combate. A multidão reuniu-se novamente e os músicos tocaram seus cânticos. Xangô sentou-se em uma cadeira no formato de um pilão, com uma pele de leopardo sobre ela. Uma nova agitação envolveu todos quando a luta começou. Como aconteceu anteriormente, Gbonkáà dominou Tìmì com seu encantamento e o fez adormecer. Com sua espada ele cortou a cabeça de Tìmì e a jogou aos pés de Xangô, dizendo: "Aqui está a cabeça que tanto querias". Xangô levantou bastante irritado e ordenou que seus guardas agarrassem Gbonkáà e matassem-no utilizando o fogo.
Armaram uma enorme fogueira, amarraram Gbonkáà com cordas fortes e lançaram-no às chamas. O povo chegou próximo à fogueira para ver o herói morrer. Mas, para a surpresa de todos, viram-no levantar-se sobre o fogo e fixar os olhos em Xangô. Quando as cordas que o atavam haviam sido consumidas pelo fogo, ele andou através das chamas sem que elas o queimassem. O povo de Oyó que a tudo assistia, ficou aterrorizado e começou a se dispersar. Somente Xangô e sua mulher, Oyá, permaneceram no local. Gbonkáà aproximou-se de Xangô, mostrou seu corpo sem uma queimadura sequer e disse: "Agora tudo acabou para você em Oyó. Deixe a cidade dentro de cinco dias e nunca mais volte". Como represália, Xangô abriu sua boca, e uma enorme chama envolveu Gbonkáà; este, porém, resistiu a ela, não lhe causando qualquer dano. Vendo que nada poderia derrotar Gbonkáà, Xangô retirou-se para seu palácio.
Quatro dias haviam se passado, e o povo de Oyó cantava canções de louvor a Gbonkáà, que agora era seu novo líder. Ao anoitecer do quarto dia, Xangô demonstrou vontade de deixar a cidade sem luta, num exílio voluntário. Na escuridão da noite, acompanhado por Oyá e seus criados fiéis, seguiu viagem em direção à cidade de Tápà, com o intuito de ficar com a mãe. Por sete anos Xangô havia governado Oyó, dando-lhe grande esplendor de conquistas, e agora se retirava triste e abatido por ver o povo se voltar contra ele em detrimento de Gbonkáà, esquecendo-se de tudo que havia feito por todos.
Pelas florestas seguia a comitiva de Xangô, que raramente falava. Estavam todos angustiados com os acontecimentos. Em meio à viagem triste e silenciosa, Xangô começou a perceber a ausência de seus companheiros, a tal ponto que, em certos trechos, constatou que apenas Oyá havia permanecido ao seu lado. Os demais haviam se dispersado, tendo alguns voltado para Oyó. Ao deparar-se com essa situação, Xangô fitou Oyá e lhe disse: "Ko kin burú tìtí ki o ma enìkan mò ni". (Por pior que alguém seja, há sempre quem goste da gente).
Dizendo isso, pediu que Oyá o aguardasse no local e retirou-se para o interior da floresta. Lá, pegou uma corda, amarrou em uma árvore denominada àyàn e enforcou-se. Oyá, que esperava-o, ao perceber que ele demorava, resolveu ir até o local onde ele poderia estar. E lá o encontrou enforcado. Ficou desesperada e voltou para Oyó, gritando que Xangô havia se suicidado. Os adversários dele rejubilaram-se e fizeram festas pelo acontecido, dizendo: "Oba so! Oba so!", que significa "o rei se enforcou". A partir daí, começaram a humilhar e a brigar com os adeptos de Xangô.
Oyá, mais calma, foi procurar os Mógbà, auxiliares diretos de seu esposo, e com eles retornou à floresta. No local em que deveria estar o corpo de Xangô nada foi encontrado. Ouviram, porém, a voz dele vinda de dentro da terra, dizendo que havia se transformado em Orixá e que deveriam voltar para o povoado, pois todos teriam uma prova de seu poder.
De volta, relataram o que tinham visto e escutado, mas ninguém deu importância e continuaram a festejar o acontecido. Até que, de repente, o céu começou a escurecer acompanhado de fortes ventanias; raios caíam em todas as direções e atingiam as casas da cidade, incendiando-as. Todos se assustaram com o que estava acontecendo, não sabendo explicar as razões da mudança repentina da natureza. A tempestade envolveu Oyó e fez as rochas se deslocarem, destruindo caminhos e causando mortes.
Em meio a todo esse clima, o Babalawo da cidade foi convocado para descobrir a causa de tudo. "É Xangô", disse ele. "Ele está zangado pela afronta que recebeu de seu povo". Em seguida, pediu que trouxessem oferendas para serem preparadas: aves, carneiro, azeite de dendê e orógbó. Seguiram para o local onde sabiam que ele havia morrido e lá depositaram as obrigações. Ao mesmo tempo olharam para o céu e viram o sinal de aceitação de Xangô, surgindo o seu símbolo de formato similar ao machado de dois gumes e denominado oxé iná, formado pelos raios que brilhavam no espaço. Então, todos começaram a gritar: "Oba kò so! Oba kò so!" ("O rei não se enforcou!"), que passou a ser frase que simbolizava a fidelidade a Xangô e que deveria ser sempre repetida. A partir desse momento, a natureza se acalmou com aquele ato de devoção e submissão.
O local se tornou desde então um santuário popular de Xangô, nos arredores da atual Oyó, onde os sucessores dos reis e descendentes do Orixá são tradicionalmente coroados. A árvore - igi àyàn - passou a representar o caminho que conduziu Xangô à divinização como Orixá, em cuja base são depositados os sacrifícios e as oferendas. Quanto à Oyá, companheira até os últimos momentos de Xangô, então sozinha, resolveu retornar a Tápà, mais precisamente à cidade de Irá, sua terra de origem, lá desaparecendo no interior da terra, surgindo depois sob o encanto dos ventos predecessores das tempestades, dos raios e trovões. Em sua memória, o povo yorubá associou-a ao rio Níger, cujo delta, formado por nove cursos d'água, reverencia seus nove filhos.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Ajuntós - Nação Cabinda

Para quem não sabe, ajuntó é o Orixá que "casa" ou "acompanha" seu Orixá de cabeça. Todos temos um Orixá que rege nosso eledá (cabeça) e outro que rege nosso corpo, além dos Orixás de perna e passagem. Invariavelmente o Orixá do corpo precisa "casar" com o Orixá de cabeça, precisam combinar, e a essa combinação chamamos "ajuntó". Por exemplo: sou filho de Oxum Pandá, e o ajuntó de minha Oxum é Xangô Aganjú (meu Orixá de corpo).Abaixo seguem os possíveis ajuntós entre os Orixás:

Bará Elegba com Oyá Timboá.
Bará Lodê com Iansã e com Obá.
Bará Lanã com Obá e algumas vezes com Oyá Niqué.
Bará Adague com Oyá Niqué e com Obá.
Bará Agelú com Oxum Pandá e algumas vezes com Oyá Niqué.

Ogum Avagã com Oyá Timboá e Oyá Dirã.
Ogum Onira com Oyá Niqué.
Ogum Olobedé com Iansã.
Ogum Adiolá com Oxum Pandá e com Yemanjá Bocí.

Oyá Timboá com Bará Elegba e com Ogum Avagã.
Oyá Dirã com Ogum Avagã.
Oyá Niqué com Bará Adague (às vezes com Bará Lanã e com Bará Agelú), com Ogum Onira, Xangô Aganjú e Xapanã Jubeteí.
Iansã Com Bará Lodê, Ogum Olobedé, Xangô Agodô, Xapanã Belujá e Xapanã Sapatá.

Xangô Aganjú Ibeje com Oxum Pandá Ibeje.
Xangô Aganjú com Oyá Niqué, Obá, Oxum Pandá e Yemanjá Bocí.
Xangô Agodô com Iansã e Oxum Olobá.

Odé com Otim e Yemanjá Bocí.
Otim com Odé.

Obá com Bará Lodê, Bará Lanã, Bará Adague, Xangô Aganjú, Xapanã Jubeteí e Xapanã Sapatá.

Ossanha com Oxum Demun e Yemanjá Bocí.

Xapanã Jubeteí com Oyá Niqué e Obá.
Xapanã Belujá com Iansã e Oxum Olobá.
Xapanã Sapatá com Iansã e Obá.

Oxum Pandá Ibeje com Xangô Aganjú Ibeje.
Oxum Pandá com Bará Agelú, Ogum Adiolá, Xangô Aganjú, Oxalá Bocum e Oxalá Olocum.
Oxum Demun com Ossanha.
Oxum Olobá com Xangô Agodô e Xapanã Belujá.
Oxum Docô com Oxalá Jobocum (às vezes com Oxalá Oromilaia).

Yemanjá Bocí com Ogum Adiolá, Xangô Aganjú, Odé, Ossanha e Oxalá Dacum.
Yemanjá Bomí com Oxalá Jobocum (às vezes com Oxalá Oromilaia).
Yemanjá Nanã Borocum com Oxalá Jobocum.

Oxalá Bocum com Oxum Pandá (quando a passagem de Orixá for Xangô Aganjú).
Oxalá Olocum com Oxum Pandá (quando a passagem de Orixá for Xapanã Jubeteí).
Oxalá Dacum com Yemanjá Bocí.
Oxalá Jobocum com Oxum Docô e Yemanjá Bomí.
Oxalá Oromilaia: somente em casos especiais este Orixá faz ajuntó com Oxum Docô e Yemanjá Bomí.