sexta-feira, 17 de junho de 2011

Ogum Revela o Segredo do Ferro

Os Orixás e o povo estavam vivendo na Terra criada por Oxalá, onde todos exerciam tarefas como caçar, arar a terra para a agricultura, plantar e construir casas para abrigo de suas famílias. Tudo era feito com muita dificuldade por falta de ferramentas adequadas para o trabalho e, agora mais ainda, pois as distâncias aumentavam, a cidade crescia para o lado das montanhas, com seus terrenos desnivelados por gigantescas rochas com caminhos inacessíveis. 
Olhando o que tinha feito e o que estava por fazer, os Orixás discutiam a melhor solução para o problema. Diziam: "Deixe um de nós começar a tarefa, derrubando as árvores e limpando a terra. Depois poderemos plantar em nossos campos". Todos concordaram, exceto Olókun: "O meu domínio é a água. A terra e as árvores não são meus afazeres". 
Ossanha, o Orixá das folhas, disse: "Eu limparei primeiro os campos". E pegou sua faca do mato, e partiu para as árvores, começando seu trabalho. Mas sua faca era feita de madeira e pedra, e assim, ele não conseguia fazer o corte necessário. Após algum tempo de uso, ela quebrou. Ossanha retornou e disse para os demais companheiros: "Eu comecei o trabalho, mas a madeira era tão dura que partiu minha faca". 
 Orixá Okô, senhor dos campos livres, falou: "Minha faca é mais forte, cortarei as árvores e destruirei as rochas". Em seguida partiu para o trabalho, mas não conseguiu executá-lo como queria, pois a sua ferramenta não suportou a árdua tarefa. Disse então: "Aconteceu o mesmo comigo, minha faca está cega e retorcida". 
Depois Exú com seu corpo potente, armou-se com suas ferramentas e foi para o meio da floresta. Lá permaneceu por um longo tempo e quando retornou, seu semblante estava amarrado: "Limpei a terra e desloquei as rochas, mas o metal de minhas armas não é forte o suficiente para tal empreitada". Um a um, os Orixás tentaram, mas não conseguiram fazer o que pretendiam. "Em que espécie de lugar estamos vivendo? Como poderemos sobreviver aqui?". 
Até aquele momento, o único Orixá que se manteve calado foi Ogum, que observava todo o movimento sem nada dizer. Somente quando todos já haviam tentado, ele levantou de onde estava e disse: "Nísisìyí àsìkò mi ni". ("Agora é a minha vez"). Partiu para o campo. Executou o corte das árvores necessárias para a abertura dos caminhos; com potentes golpes destruiu as rochas, enquanto outras foram deslocadas para manter a terra livre das pedras. Toda a terra foi arada, amaciada e semeada. Deu novos caminhos, enquanto ia eliminando plantas desnecessárias. Ogum trabalhou até o final da tarde ininterruptamente. Quando terminou sua obra, retornou para junto dos demais Orixás que o aguardavam. Lá chegando exibiu suas armas e ferramentas utilizadas. Estavam afiadas e intactas. 
Diante do que viam, perguntaram: "Que metal esplêndido é este?" Ogum respondeu: "O segredo desse metal me foi dado por Olodumaré. Chama-se Irin, o ferro". Os Orixás olhavam as ferramentas de Ogum com muita admiração, dizendo: "Se tivéssemos o conhecimento do ferro, nada para nós seria difícil". Ogum observou o interesse de todos, mas relutou em ensinar seu segredo. "Olodumaré não me autorizou", disse. Mas não se negou a fazer armas e ferramentas a quem lhe pedisse. Para isso, construiu uma forja em sua casa e passou a fabricar os diversos tipos de armas e instrumentos de trabalho, pois ele além de guerreiro, era um grande caçador. A caça, até aquela época, era efetuada com armadilhas e armas bem leves, além de se contar com muita sorte nas empreitadas. 
A relutância de Ogum continuava a incomodar os demais, que embora estando com as novas armas criadas por ele, insistiam em conhecer o segredo de sua fabricação. Pensando no assunto, todos tomaram a iniciativa entitulá-lo Osinmalè, o Chefe dentre as Divindades (Osìn: chefe; irúnmalè: divindade). Considerando tudo isso, Ogum concordou com o pedido de todos. Passou a ensinar o processo de fabricação da liga dos metais, a criação de armadilhas, ferramentas, lanças, espadas e facas. 
Em pouco tempo, todos os Orixás eram possuidores do conhecimento do uso do ferro. E vieram pessoas de outras regiões para aprender, e ele ensinou tudo a todos. Embora Ogum tivesse aceito o cargo de chefia que lhe fora dado pelos Orixás, ele continuava a ser o grande caçador que era, pois muitos dependiam de sua capacidade para sobreviver. E assim, embrenhava-se floresta adentro a fim de caçar os animais de que tanto gostava. Vestia-se com roupas de couro presas por màrìwò, equipava-se com as armas de luta e seguia seu caminho. 
A atividade de caçador era muito árdua, obrigando-o a ficar isolado por vários dias, dormindo sobre a terra ou em árvores. Ele abatia muitos animais, em constantes lutas. Quando saía da floresta, estava sujo, seu cabelo, embaraçado, e as peles que vestia ficavam rasgadas e manchadas do sangue de sua caça. Seguia o caminho de volta à cidade para reencontrar seus companheiros. 
Certo dia, os Orixás, ao verem Ogum chegando daquele jeito, disseram: "Quem é este estranho todo sujo que vem da floresta? Certamente não é Ogum, o qual indicamos para ser nosso chefe". Eles ficaram descontentes com Ogum e continuaram: "Um chefe deveria se manter com dignidade, suas roupas deveriam ser limpas, e seu cabelo bem aparado. Você está indistinguível do mais humilde caçador de Ifé, e o ar à sua volta está empesteado de carne morta". Dizendo isso, concluíram: "O cargo que lhe demos, o tiramos agora. Você não é mais nosso chefe". 
Ogum ouvindo aquilo replicou: "Quando vocês precisaram do segredo do ferro, souberam implorar-me para ser o chefe de todos. Agora que já são possuidores do poder, dizem que eu cheiro mal". Falando isso, ele foi até o rio mais próximo, tirou suas roupas sujas de pele de animal e banhou-se. Quando já estava limpo, vestiu suas roupas de màrìwò (folhas de dendezeiro depois de desfiadas mediante um ritual específico), pegou suas armas e partiu para a cidade de Ìré. Construiu uma casa embaixo de uma árvore de akòko, e lá permaneceu solitário, mas fiel aos seus compromissos de se manter vigilante nas terras de Ilé Ifé.

2 comentários:

  1. Mto lindo a estória....

    cada dia mais surpreendente seu blog...parabens mano....

    ResponderExcluir
  2. que bom ter encontrado um blog de minha religião , adoro essas lendas . Seguindo seu blog , se puder segue o meu também

    http://andyantunes.blogspot.com/

    ResponderExcluir